Muita gente que faz estimulação cerebral profunda (DBS) para Parkinson imagina que o congelamento da marcha — aquele “travamento” do pé no chão — vai embora de vez. Mas a realidade é um pouco mais complexa. E entender isso ajuda muito a lidar melhor com o problema.
Neste texto, você vai descobrir por que o freezing pode surgir anos depois da cirurgia, o que a ciência mais recente mostra sobre isso e como médicos ajustam estímulo e medicação para tentar melhorar esse quadro.
Por que isso acontece?
O freezing não é apenas “um sintoma a mais”. Ele é resultado de uma falha na comunicação entre regiões do cérebro que coordenam movimento, equilíbrio e ritmo da caminhada.
Depois do DBS, braços e pernas costumam responder muito bem: rigidez melhora, tremor diminui, a lentidão reduz. Só que a parte do movimento que envolve tronco, postura e ritmo da marcha é controlada por circuitos diferentes, que sofrem mais com a progressão da doença.
Um estudo recente acompanhou pessoas com Parkinson que fizeram DBS e voltaram a apresentar freezing mesmo quando estavam no melhor momento do dia — com medicação e com estimulação ligadas. Isso é importante: não é falta de remédio ou “DBS fraco”. É o próprio mecanismo do freezing que muda com o tempo.
O que o estudo encontrou
O trabalho avaliou cuidadosamente cada pessoa em várias situações: com e sem medicação, com e sem estimulação, e até testando frequências diferentes do DBS.
Três achados chamam atenção:
1. O freezing melhora, mas não desaparece completamente
Mesmo depois de muitos anos de cirurgia, tanto o remédio quanto a estimulação ajudam, cada um um pouco, mas não a ponto de eliminar totalmente o congelamento.
Isso mostra que o cérebro ainda responde — só que responde menos do que antes.
2. Cada pessoa reage de um jeito
Aqui está um ponto crucial:
– Alguns melhoraram mais com remédio do que com DBS.
– Outros melhoraram mais com DBS do que com remédio.
– Uma parte piorou com um e melhorou com o outro.
Ou seja: não existe “receita pronta”. A mesma estratégia não funciona para todo mundo — e isso explica por que ajustes finos são tão importantes no consultório.
3. Frequências mais baixas de estimulação podem ajudar
Para parte dos participantes, diminuir a frequência do DBS deixou o caminhar mais estável. Não é milagre, não funciona para todos, mas abre uma porta:
às vezes, o DBS precisa ser “reafinando” como se fosse um instrumento musical.
Sinais que merecem atenção
Procure orientação médica se perceber:
- Travamentos que começam a ficar mais frequentes
- Sensação de que o pé “cola” no chão ao fazer curvas ou passar por portas
- Medo de cair
- Queda recente
- Perda de ritmo na caminhada mesmo com medicação em dia
Esses sinais podem indicar que o cérebro está mudando — e que é hora de reavaliar programação, dose de remédio e estratégias de segurança.
O que ajuda no dia a dia
Algumas ações simples fazem diferença:
- Manter a rotina de horários da medicação
- Usar pistas visuais ou sonoras (como contar passos ou mirar um ponto no chão)
- Evitar mudanças bruscas de direção
- Caminhar com atenção plena, evitando conversar e andar ao mesmo tempo
- Conversar com a equipe de movimento sobre ajustes de estimulação
Conclusão: há saída, mesmo quando o passo trava
O freezing que aparece anos após o DBS não significa que a cirurgia “parou de funcionar”. Significa que a doença avançou para áreas do movimento que respondem de forma diferente — e que agora o tratamento precisa ser mais personalizado.
Buscar ajuda cedo, reconhecer os gatilhos e ajustar a estimulação fazem toda diferença. Informação clara é o primeiro passo para caminhar com mais segurança.
Referência
Barbosa R, et al. Differential Effects of Levodopa and Stimulation on Post-Surgery Freezing of Gait in Subthalamic Nucleus Deep Brain Stimulation Parkinson’s Disease Patients. Movement Disorders Clinical Practice. 2025.