14 de outubro de 2025

O futuro do tratamento do Parkinson: quando o cérebro aprende a se ajustar sozinho

Introdução

Quem tem Doença de Parkinson sabe que o tratamento é uma verdadeira arte de equilíbrio. Um dia o remédio faz efeito rápido, no outro demora mais. Às vezes o tremor melhora, mas o cansaço, o sono ruim e a ansiedade continuam.

E se existisse uma forma de o cérebro ajustar o tratamento sozinho, conforme o momento do dia e o que o corpo precisa?

Essa é a proposta da nova geração da estimulação cerebral profunda adaptativa — uma tecnologia que promete revolucionar o cuidado com o Parkinson.

O que é a estimulação cerebral profunda (DBS)

A DBS é um tratamento cirúrgico indicado para alguns pacientes com Parkinson.

Ela funciona assim: pequenos eletrodos são colocados em áreas específicas do cérebro para enviar estímulos elétricos controlados por um aparelho parecido com um marca-passo.

Esses estímulos ajudam a regular os circuitos cerebrais que controlam o movimento, reduzindo sintomas como tremor, rigidez e lentidão.

A técnica já é usada há mais de 20 anos e trouxe qualidade de vida para milhares de pessoas.

Mas ela ainda tem um desafio: o estímulo é constante, mesmo quando o cérebro não precisa dele o tempo todo.

Quando o cérebro muda, o estímulo também deveria mudar

O cérebro de uma pessoa com Parkinson não funciona igual ao longo do dia.

Os sintomas variam conforme a absorção dos remédios (como a levodopa), o nível de dopamina, o sono e até o estresse.

Essa variação é o que os especialistas chamam de flutuação — períodos em que o paciente está “ligado” (ON) e períodos em que o efeito da medicação “acaba” (OFF).

Hoje, os aparelhos de DBS tradicionais não acompanham essas mudanças.

Por isso, às vezes o estímulo é forte demais (causando fala arrastada ou apatia) ou fraco demais (quando o tremor volta).

A nova geração: estimulação adaptativa (aDBS)

Pesquisas recentes, como a de Swinnen e colegas publicada em 2025, mostram um avanço empolgante: a estimulação cerebral adaptativa, ou aDBS.

Essa tecnologia “ouve” o cérebro em tempo real — por meio de sensores que captam os sinais elétricos — e ajusta automaticamente a intensidade do estímulo conforme o que o cérebro está fazendo.

É como se o aparelho aprendesse a conversar com o sistema nervoso:

  • Se percebe que o cérebro está mais lento, aumenta o estímulo.
  • Se nota sinais de fadiga ou ansiedade, reduz.
  • Tudo isso sem o paciente precisar apertar botão algum.

Por que isso é importante

O Parkinson não é apenas uma doença do movimento.

Além do tremor e da rigidez, há sintomas chamados não motores, como:

  • Ansiedade, tristeza ou apatia;
  • Cansaço e distúrbios do sono;
  • Problemas intestinais e dor.

Esses sintomas também variam ao longo do dia e podem piorar com excesso ou falta de estímulo cerebral.

A aDBS tenta equilibrar tudo isso, mantendo o cérebro no ponto certo — nem demais, nem de menos.

Como o corpo influencia o cérebro

Os estudos mostram que o problema não está só no cérebro.

O intestino tem papel central: se o remédio não é absorvido direito (por causa de constipação, bactérias ou alimentos ricos em proteína), o efeito da levodopa fica irregular.

Isso causa os períodos “ON e OFF” — e o humor, o sono e o movimento oscilam juntos.

A boa notícia é que a nova estimulação adaptativa pode compensar essas variações.

Ela reconhece quando o corpo não está respondendo bem ao remédio e ajusta o estímulo para manter o equilíbrio.

O que esperar do futuro

Ainda estamos no início dessa revolução, mas os resultados são promissores.

Nos próximos anos, os cientistas esperam que a DBS adaptativa consiga:

  • Reduzir os períodos “OFF”;
  • Melhorar sintomas emocionais e de sono;
  • Diminuir efeitos colaterais como apatia ou fala arrastada;
  • Tornar o tratamento mais personalizado, ajustado a cada pessoa.

É o primeiro passo para um “marca-passo cerebral inteligente”, capaz de entender o que o paciente sente e reagir em tempo real.

Conclusão

O Parkinson é uma doença complexa, que vai muito além do tremor.

Com a chegada da estimulação cerebral adaptativa, a esperança é que o tratamento se torne mais humano, preciso e conectado com o corpo e a mente.

Talvez, em breve, o cérebro finalmente tenha um parceiro à altura: um aparelho capaz de aprender com ele.


Fontes principais:

  • Swinnen SP, et al. Towards Adaptive Deep Brain Stimulation for Non-Motor Symptoms in Parkinson’s Disease. Movement Disorders. 2025.
  • Leta V, et al. Gastrointestinal barriers to levodopa transport and absorption in Parkinson’s disease. Eur J Neurol. 2023.
  • Rodríguez-Violante M, et al. Motor and non-motor wearing-off and its impact in the quality of life of patients with Parkinson’s disease. Arq Neuropsiquiatr. 2018.